terça-feira, 11 de outubro de 2016

MUSEU DO PRADO 1: DIEGO VELÁSQUEZ

Prezados, o que falar do museu do Prado? Um dos museus mais famosos do mundo, resultado, principalmente, da riqueza que a corte espanhola gozava nos séculos XVI e XVII, principalmente, bem como da explosão cultural naquela país chamada de “Siglo de Oro”, com expoentes culturais em diversas frentes: Cervantes, Velásquez, Góngora, Calderón de La Barca, Lope de Veja, etc etc etc.

Quando adolescente olhava o livro da Editora Verbo, da Coleção “Grandes Museus do Mundo”, o Prado povoava minha imaginação, sem ter sequer a perspectiva de chegar um dia a conhecê-lo.

Entrada do Museu do Prado
 (propaganda da Exposição de Bosch - "El Bosco")


Museu do Prado 
(propaganda da Exposição de Bosch - "El Bosco")


Para um brasileiro, acostumado às loas expressadas a um MASP, chegar ao Museu do Prado é surreal. Estar diante de “trocentos” Velasquez, ou de “trocentos” Goyas, ou de outros tantos Rafaéis parece a ilusão da miragem de um sonho de todo aquele que ama as artes Plásticas. Mas para mim, a viagem a este museu, e por este museu, guardou surpresas que nunca sequer imaginei.

Como são diversas experiências que tive ao longo de cinco horas e meia de visitação, vou separar minhas considerações em alguns textos, começando este por Velásquez.

Em primeiro lugar, conhecer pessoalmente, dois dos quadros mais famosos da história da Arte: A Rendição de Breda (ou “As Lanças”) e aquele que é conhecido como “As meninas”. Somente sobre esses dois quadros já foram escritos artigos diversos, sobre a maestria na composição (o que é evidente à primeira vista), e dos diversos detalhes existentes, que colaboram o encontro entre espectador  e o artista, ainda que alguns séculos os separem.

A Rendição de Breda (ou "As Lanças")

As Meninas


Dignas de destaque são obras que não estão tanto sob os holofotes da mídia (logo abaixo), mas que foram objeto de releitura feita no século XX e, por isso mesmo, valorizadas: El Bufón Calabacillas (1636-37), Francisco Lezcano, el niño de Vallecas (163-45) e o  Retrato del enano Don Sebastián de Morra (1645).


El Bufón Calabacillas (1636-37), 

Francisco Lezcano, o menino de Vallecas (1643-45) 
Este quadro foi base de um trabalho do famoso pintor inglês Roger Bacon. 

Retrato do anão Sebastião de Morra (1645).

Para os releitores, a visão dessas espécies de quadros parece um reconhecimento do humano, ao dar dignidade a figuras preteridas no trato cotidiano da corte. Outros, porém, entendem que se tratava de uma atitude burlesca de Velasquez, estabelecendo uma crítica à corte espanhola ao utilizar figuras marginais em destaque e dar títulos nobres a elas.

Seja qual for o motivo, percebemos a maestria em perscrutar a psicologia do retratado.

Tenho que confessar que as miríades de quadros de personagens da Corte espanhola, principalmente de Fernando IV, ainda que feitos por um mestre como Velásquez, hoje em dia me parecem enfadonhas. Contudo, ainda assim, podemos perceber uma espécie de esmero técnico na confecção dos quadros, onde, talvez, a carência de assunto tivesse que dar relevo à eficácia da forma, ou onde houvesse o perigo quanto a possibilidade de "desnudar" o retratado, como vemos, por exemplo, no retrato de "La Reina Isabel de Bourbon a Caballo":

La Reina Isabel de Bourbon a Caballo (1635-36)

Vejam o detalhe do vestido da Dona Rainha, e percebam o quanto de suor Velasquez deve ter gasto ao pintar o tecido:

Detalhe do vestido do quadro anterior

Outro quadro que também povoava minha memória de criança, que havia na coleção "Mitologia", da editora Abril, era o Triunfo de Baco (ou "os bebuns"... ou "os ébrios", numa linguagem mais castiça). A visão de alguns "populares" espanhóis, contemporâneos de Velasquez, juntamente com o deus Baco, da antiguidade romana, era um anacronismo que minha cabeça de criança não conseguia capturar. Mas juntar coisas díspares temporalmente me parece uma forma de estabelecer o caráter de "eternidade" ao "aqui e agora", ao presente.

O Triunfo de Baco (1628-29)

Esta experiência de estar próximo de obras tão icônicas para um artista, quase um momento de reverência, se quebrou ao ver o frescor de uma "Cabeça de Veado", onde o pintor parecia demonstrar a leveza da pintura e, o que julgo ser mais importante, o amor que tinha ao trabalho de pintar: pinceladas rápidas, fluídas, sem o policiamento formal de outras pinturas. A solução de pintura dos pelos me parece maravilhosa.

Cabeça de Veado (1628-29)

Em suma: ficar na presença de dezenas de Velasquez é uma experiência intraduzível para um artista,  para quem ama este labor ou para um amante da arte.

segunda-feira, 10 de outubro de 2016

MUSEU CALUSTIAN GULBENKIAN

Estive em setembro de 2016 em Portugal e Espanha e aproveitei para aumentar meu conhecimento pictórico no  “Velho Continente”. Neste caso visitei dois museus bem expressivos: Calouste Gulbekian em Lisboa e o Museu do Prado em Madri. Neste primeiro momento, vou falar do Calouste Gulbekian.

O Museu Calouste Gulbekian fica em Lisboa, na Av. de Berna, 45A. Parei na estação de metrô São Sebastião e caminhei até lá. Vamos pular o belo ambiente no qual o museu está instalado, bem como o as belas instalações do próprio museu, como vocês podem observar nas fotos abaixo:

Entrada principal do museu.


Jardim da fundação

Ao adentrarmos o museu, temos contato com diversas coleções: Arte Egípcia, Greco-romana, da Mesopotâmia, do Oriente Islâmico, Arte Armênia, Chinesa, Pintura, Escultura, etc.

No meu entendimento as coleções que mais me atraíram foram a de pintura e arte do Oriente Islâmico, principalmente esta.

Contudo, a primeira peça que chama a atenção é um vaso grego (vide foto abaixo), em forma de cálice/cratera, de cerca de 440 a.C. com diversas figuras mitológicas. A leveza das figuras e a decoração bicromática do vaso nos fazem refletir sobre como é estranhamente surpreendente que vasos de utilização cotidiana há cerca de 2.500 anos sejam hoje peças de extraordinária beleza, dignos de exposição em um museu. Pela confecção, percebe-se que o autor colocou sua alma na peça e ela ainda se encontra presente, atravessando as eras e tempos.

Vaso de figuras vermelhas (Grécia - Ática - c. 440 a.C.)


Para numismatas, a coleção de moedas gregas antigas é muito interessante também, com algumas tendo um padrão de qualidade que não sabia existir naqueles tempos. Também causa reflexão ver aquela miríade de cabeças de pessoas importantes que nunca ouvimos falar.  

moedas gregas (575 - 75 a.C.)

Outra peça interessante é um baixo relevo assírio representando um gênio alado, da época de Assurnasirpal II (884 a 859 a.C.), com algumas inscrições grafadas por cima do relevo, fazendo existir um contraste interessante na peça. Se você clicar na foto abaixo, vai perceber o contraste na textura da pedra e talvez consiga ter uma percepção pálida do que significava a beleza dessa peça quando ela foi criada.

Gênio alado - relevo assírio (séc IX a.C.)


Agora, o que realmente é extraordinário no museu é a coleção de arte islâmica, onde pequenos azulejos tomam uma forma épica de construção pictórica, baseada fortemente na tradição daqueles povos, e peças de artesanato como pratos e tapetes carregam consigo a glória de uma civilização que teve seu auge por volta dos séculos IX e XII. 

Temos, por exemplo, um azulejo do século XIV com um pássaro / dragão, que parece uma fênix (?). Se observar a foto (abaixo), que tirei com bastante detalhe, vai ver o trabalho cuidadoso com que o artesão realizou sobre o azulejo, que deveria ser um dos diversos que fez.

Azulejo (Pérsia - Caxã - séc. XIV)
faiança moldada, decoração de "reflexo metálico"


Até uma peça usual tal qual um batedor de tapetes assume uma presença artística que não estamos mais habituados a ter em nossos cotidianos, que ainda são fabricados no Oriente Próximo.

Batedor de tapetes "contemporâneo"

É claro que, ao ver os azulejos orientais a gente pode perceber um pouco da herança que os orientais deixaram para a azulejaria portuguesa, como os exemplos abaixo:

Painel de azulejos (Turquia - 2ª metade do séc. XVI)

Painel de azulejos (Turquia - 2ª metade do séc. XVI)

Painel de azulejos (Turquia - 2ª metade do séc. XVI)

É claro que não há como não se maravilhar diante da coleção chinesa, ou de outras coleções expostas no museu, mas deixaremos de mencioná-las neste texto. 

Quando chegamos à ala de pintura, vemos diversos trabalhos que nos deixam extasiados, apesar de não encontrar no museu nenhuma obra-prima midiática, como a “Gioconda”, por exemplo. Mas alguns trabalhos enchem nossos olhos, como é o caso de obras de Turner (Quillebeuf, Foz do Sena – 1833 – óleo s/ tela), do pré-Rafaelita Edward Burne-Jones (O Espelho de Vênus – 1875 – óleo s/ tela), ou as antigas paisagens de Ruisdael que tanto me agradam desde quando eu era adolescente (Vista da Costa da Noruega ou Mar Encrespado Junto à Costa – c. 1660 – óleo s/ tela).

Turner (Quillebeuf, Foz do Sena – 1833 – óleo s/ tela)


Edward Burne-Jones (O Espelho de Vênus – 1875 – óleo s/ tela)


Ruisdael (Vista da Costa da Noruega ou 
Mar Encrespado Junto à Costa – c. 1660 – óleo s/ tela)


Há, também, diversos outros autores como : Rembrandt, Rubens, Renoir, Degas, Francesco Guardi, Frans Hals, Millet, Manet, Monet, Van Dyck, Fantin-Latour, etc.

De toda forma, é meu entendimento que fazer uma visita ao museu Gulbenkian é algo imprescindível para o artista que visita Lisboa. Separe, pelo menos, duas horas e meia para uma visita ao acervo permanente.